Governo do Rio apresenta ao STF plano de reocupação de territórios dominados pelo crime


O governo do Rio de Janeiro apresentou nesta segunda-feira (22) ao Supremo Tribunal Federal (STF) um plano estratégico para a recuperação de territórios controlados pelo crime organizado. A proposta prevê novas medidas de enfrentamento à atuação de facções criminosas e milícias, incluindo o combate a operações financeiras ilegais, e deverá ser executada em cinco etapas.

O início do plano está previsto para depois do carnaval de 2026, com ações concentradas em comunidades da zona sudoeste da capital fluminense. O documento atende a uma das exigências da ADPF 635, que cobra do Estado medidas para reduzir violações de direitos e o elevado número de mortes em operações policiais nas favelas do Rio.

A região escolhida é marcada pelo domínio de milícias e do Terceiro Comando Puro, além de disputas com o Comando Vermelho. O projeto-piloto começará por Rio das Pedras, considerada o berço das milícias, além da Muzema e da Gardênia Azul. Segundo o governo, as áreas foram selecionadas pelo nível crítico de atuação de grupos armados e por indicadores de vulnerabilidade social e degradação ambiental, que afetam cerca de 70 mil moradores.

Chamado de Plano Estratégico de Reocupação Territorial, o projeto foi estruturado em cinco fases integradas. A primeira, voltada à segurança pública e à justiça, prevê mapeamento detalhado do território e intervenção direta, com presença ostensiva das forças de segurança por período determinado. O plano admite o uso de forças federais e das Forças Armadas, se necessário, além de ações de monitoramento.

Essa etapa também tem como foco o enfrentamento do controle de serviços básicos por facções criminosas, como a venda irregular de gás, gelo e internet, atividades frequentemente usadas para lavagem de dinheiro. Ministério Público e Defensoria Pública devem atuar de forma conjunta nesse estágio inicial.

As segunda e terceira fases concentram-se no desenvolvimento social e urbano. O objetivo é ampliar o acesso a direitos por meio de mutirões de assistência social, reformas de escolas, implantação do ensino em tempo integral, oferta de cursos técnicos, além de atividades esportivas, culturais e profissionalizantes. Estão previstas ainda obras de saneamento, iluminação pública, limpeza urbana, regularização fundiária e melhorias na mobilidade.

A quarta fase busca estimular o desenvolvimento econômico, com incentivo a microempresas, cooperativas e ao turismo comunitário. Já a quinta etapa é voltada à sustentabilidade do projeto, com articulação entre diferentes níveis de governo e a sociedade civil para monitorar a execução das ações.

Em nota, o governador Cláudio Castro afirmou que o conceito de reocupação vai além da presença policial e representa o retorno do Estado aos territórios. Segundo ele, a proposta depende da integração entre segurança e políticas sociais para promover mudanças duradouras. “O foco é a permanência e a transformação da realidade local, conforme as diretrizes do STF e os anseios da população”, declarou.

De acordo com a Secretaria de Segurança, cerca de 400 moradores da Gardênia Azul, Rio das Pedras e Muzema participaram da elaboração do plano, relatando problemas como infraestrutura precária e condições inadequadas de moradia. A participação da comunidade está prevista desde a primeira fase, por meio de conselhos locais e reuniões regulares com o poder público.

A etapa final inclui a criação de uma plataforma digital de transparência, com indicadores das ações e observatórios de violência. O documento, com cerca de 300 páginas, afirma que o plano não prevê anistia penal nem ações específicas de desarmamento, mas se inspira na experiência de Medellín, na Colômbia, ao apostar na continuidade de políticas públicas integradas.

O diagnóstico do governo aponta que, entre 2007 e 2024, houve expansão do controle territorial por grupos armados na região metropolitana do Rio. Atualmente, cerca de um terço da população do estado estaria submetida a algum tipo de influência criminosa. O plano sustenta que operações policiais isoladas são insuficientes sem o apoio de políticas públicas estruturantes.

“O objetivo central é substituir a economia do crime por um ecossistema de oportunidades lícitas, com geração de emprego, renda e empreendedorismo”, afirma o governo do Rio no documento enviado ao STF.