Câmara dos Deputados aprova isenção do Imposto de Renda para salários de até R$ 5 mil
A Câmara dos Deputados aprovou por unanimidade, nesta quarta-feira (1º), o Projeto de Lei 1087/25, que eleva a faixa de isenção do Imposto de Renda para rendimentos mensais de até R$ 5 mil. A medida, vista como uma vitória expressiva do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), foi possível após a oposição retirar suas emendas, o que abriu caminho para um acordo amplo no plenário.
A sessão contou com a presença da ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann (PT-PR), que atuou diretamente nas negociações com as bancadas. O Planalto tratou a aprovação como uma resposta imediata à pressão da classe média e dos trabalhadores assalariados diante do peso da carga tributária.
O relator do projeto, Arthur Lira (PP-AL), explicou que apenas 3 das mais de 100 emendas apresentadas foram aceitas. Entre elas, estão a permissão para que dividendos referentes a 2025 ainda não pagos possam ser distribuídos até 2028 e a exclusão das taxas judiciais cobradas por cartórios da base de cálculo do imposto.
Segundo estimativas oficiais, a medida deve beneficiar 15,5 milhões de contribuintes. Desse total, 10 milhões deixarão de pagar o imposto a partir de 2026, enquanto outros 5,5 milhões terão redução parcial da carga até a faixa de R$ 7.350. O impacto fiscal previsto é de R$ 25,4 bilhões por ano.
Para equilibrar as contas públicas, o projeto cria um piso mínimo de 10% de tributação para cerca de 141 mil contribuintes de alta renda, o que representa apenas 0,13% do total de declarantes. Esse grupo, que atualmente paga em média 2,5% de alíquota efetiva, passará a contribuir mais sobre rendas superiores a R$ 600 mil anuais, incluindo dividendos e ganhos com investimentos imobiliários e no agronegócio.
Arthur Lira reconheceu que a medida não resolve a regressividade do sistema tributário, mas afirmou que representa um “primeiro passo para corrigir uma distorção social”. O líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias (RJ), destacou que a aprovação só foi possível graças à insistência do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e classificou o resultado como uma conquista estrutural. Já a deputada Talíria Petrone (Psol-RJ) ressaltou que o projeto atende a uma demanda histórica da população.
A oposição, por sua vez, criticou a proposta. O deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) chamou a mudança de “troco” e defendeu cortes mais profundos nos impostos. O vice-líder Capitão Alden (PL-BA) alertou para riscos de “fuga de capitais” e afirmou que a nova taxação dos mais ricos pode prejudicar o mercado brasileiro.
Horas antes da votação, o presidente Lula reuniu, no Palácio do Planalto, líderes partidários de esquerda e representantes de movimentos sociais que defendem o Plebiscito Popular pela taxação dos super-ricos, mobilização que já recolheu mais de 1,5 milhão de assinaturas em todo o país.
O presidente havia antecipado o resultado favorável e relembrou que, desde 2023, a faixa de isenção já havia sido ampliada para até dois salários mínimos, beneficiando 10 milhões de trabalhadores. Com a nova lei, esse número deve dobrar, alcançando 20 milhões de brasileiros entre os que terão isenção total e os que contarão com redução parcial no Imposto de Renda.
Isenção do IR: um passo para corrigir desigualdades históricas
A aprovação, pela Câmara dos Deputados, do Projeto de Lei 1087/25 que amplia a faixa de isenção do Imposto de Renda (IR) para salários de até R$ 5 mil não é apenas uma medida de alívio imediato para milhões de trabalhadores. Ela representa também uma tentativa concreta de atacar um dos pontos mais criticados do sistema tributário brasileiro: sua forte regressividade.
O Brasil possui uma das estruturas de arrecadação mais desiguais do mundo. Em vez de cobrar mais dos mais ricos, como ocorre em economias desenvolvidas, o país concentra sua receita em tributos indiretos, embutidos no consumo. Isso significa que ricos e pobres pagam a mesma alíquota sobre produtos e serviços, mesmo que a parcela do salário comprometida seja muito maior para os mais pobres. Já o Imposto de Renda, que poderia funcionar como um mecanismo de justiça social, vinha perdendo esse papel ao longo das últimas décadas, pois a tabela estava defasada e deixava trabalhadores da classe média baixa proporcionalmente mais sobrecarregados do que contribuintes de alta renda.
Ao elevar a faixa de isenção para R$ 5 mil, o governo busca devolver progressividade ao sistema. Estima-se que 15,5 milhões de pessoas sejam beneficiadas, sendo que 10 milhões ficarão totalmente livres do tributo a partir de 2026. O impacto não se resume ao bolso individual: trata-se de liberar parte da renda de famílias que vivem pressionadas por inflação de alimentos, transporte e serviços básicos, permitindo maior poder de consumo e dinamização da economia interna.
Entretanto, a medida vai além do benefício imediato. Ao criar também um piso mínimo de tributação de 10% para 141 mil contribuintes de altíssima renda, o projeto corrige um dos maiores paradoxos da carga tributária nacional: milionários e bilionários, por meio de rendimentos de capital, muitas vezes pagavam alíquotas efetivas menores do que trabalhadores assalariados de classe média. Essa inversão de lógica, que há anos gera críticas de economistas e movimentos sociais, começa a ser enfrentada.
Ainda assim, especialistas alertam que a mudança não resolve sozinha o caráter regressivo do sistema. É um passo inicial que aponta para uma direção diferente: a de redistribuir a carga tributária, reduzir a desigualdade e responder ao clamor da sociedade por mais justiça fiscal. O discurso do presidente Lula ao lembrar que 20 milhões de brasileiros serão beneficiados entre isenção total e redução parcial mostra o peso político da medida. Para o governo, é também uma forma de se conectar à pauta da classe média, historicamente ressentida com a alta carga de impostos e, ao mesmo tempo, sinalizar que os super-ricos não podem permanecer fora do alcance da tributação justa.
Em resumo, a ampliação da isenção para até R$ 5 mil tenta corrigir uma distorção estrutural: no Brasil, quem ganha pouco ou médio sempre pagou proporcionalmente mais impostos do que quem ganha muito. Embora a solução definitiva dependa de uma reforma tributária mais ampla, esse projeto representa uma mudança de direção no debate sobre quem deve, de fato, sustentar o peso do Estado.
Isenção do IR até R$ 5 mil — como a medida se compara a práticas internacionais e o que isso significa para justiça fiscal no Brasil
A ampliação da faixa de isenção do Imposto de Renda para rendimentos de até R$ 5 mil — aprovada pela Câmara como você já acompanhou — é, em essência, uma tentativa de aproximar o Brasil de um princípio que prevalece em muitos países desenvolvidos: tirar peso tributário de quem tem menor renda e usar instrumentos progressivos para tributar mais quem tem maior capacidade contributiva. Em termos práticos, isso significa reduzir a regressividade que torna os tributos sobre consumo mais pesados para os pobres e recolocar o imposto de renda no papel de ferramenta de redistribuição.
Em economias como a Suécia, Alemanha, Reino Unido, Canadá e Estados Unidos, a tributação sobre a renda pessoal é explicitamente progressiva, com faixas e alíquotas que aumentam à medida que a renda sobe. Países escandinavos, por exemplo, combinam altas alíquotas marginais e ampla tributação sobre renda de capital, sustentando serviços públicos robustos e redes de proteção social. Na Alemanha e no Reino Unido, faixas de isenção e alíquotas progressivas protegem rendimentos mais baixos enquanto aplicam tributos mais pesados sobre níveis elevados de renda. Essas estruturas são usadas deliberadamente como mecanismos de redistribuição.
O contraste com o Brasil é notório: historicamente o país dependeu fortemente de tributos indiretos (impostos sobre consumo), que são regressivos por natureza — todos pagam a mesma alíquota ao comprar um produto, o que pesa mais para quem tem menor renda. Relatórios e avaliações internacionais destacam essa característica do sistema tributário brasileiro e recomendam maior ênfase em tributos diretos progressivos e em uma taxação mais efetiva sobre renda de capital para reduzir desigualdades. A recomendação técnica é clara: tornar o IR mais progressivo e taxar adequadamente ganhos de capital e dividendos contribui mais para justiça fiscal do que aliviar impostos sobre consumo.
A proposta aprovada no Congresso brasileiro combina dois movimentos que são coerentes com essa recomendação internacional. Por um lado, amplia a isenção para até R$ 5 mil, beneficiando 15,5 milhões de contribuintes e aliviando especialmente assalariados e famílias de classe média baixa — um efeito direto sobre consumo e rendimento disponível. Por outro, o projeto inclui uma tributação mínima (piso de 10%) para uma parcela muito pequena de declarantes de alta renda, buscando corrigir a distorção em que rendas de capital e dividendos eram, na prática, tributadas de forma relativamente leve. Juntos, esses itens tentam mitigar a assimetria entre quem vive de salário e quem obtém grande parte de renda em forma de capital. (Dados: benefícios a 15,5 milhões; impacto fiscal ~R$ 25,4 bilhões ao ano — conforme estimativa oficial).
Ainda assim, comparando com padrões internacionais, a medida brasileira é um passo inicial, não a solução completa. Países com sistemas tributários efetivamente redistributivos combinam: (1) alíquotas progressivas sobre salários, (2) tributação efetiva de renda de capital (dividendos, juros, ganhos de capital), (3) mecanismos anti-elisão e transparência fiscal, e (4) um desenho que usa benefícios sociais (transferências) para garantir impacto distributivo. O Brasil avança na direção correta ao aumentar a isenção e tributar mais certas rendas altas, mas para igualar o impacto redistributivo observado em países desenvolvidos seriam necessários ajustes adicionais — por exemplo, alíquotas efetivas maiores sobre renda de capital e medidas para reduzir a evasão e elisão fiscais.
Do ponto de vista macroeconômico, a isenção amplia a renda disponível de milhões e tende a ter impacto contracíclico (estimula consumo), o que pode ajudar a economia doméstica no curto prazo. Por outro lado, o custo fiscal (estimado em R$ 25,4 bilhões ao ano) obriga o governo a buscar compensações: tributar mais fortemente rendimentos de alta renda, revisar benefícios fiscais ineficientes ou ajustar despesas. A eficácia distributiva final dependererá da capacidade do Estado de efetivamente arrecadar das novas bases propostas (incluindo mecanismos para tributar dividendos e outras rendas de capital) e de canalizar recursos para políticas que reduzem desigualdades — educação, saúde e transferências condicionais.
Em resumo: a isenção até R$ 5 mil é um movimento relevante e coerente com práticas internacionais de justiça fiscal — é um passo concreto para diminuir a carga sobre quem tem menor capacidade contributiva e para recuperar o papel redistributivo do imposto de renda. Mas, para se tornar uma mudança estrutural comparável aos sistemas mais redistributivos do mundo, será necessário complementá-la com medidas que elevem a tributação efetiva sobre rendas de capital, combatam evasão/elusão e reforcem políticas públicas redistributivas. Só assim a reforma cumprirá totalmente o objetivo declarado: transformar um sistema tributário historicamente desigual em um instrumento consistente de justiça social.