Relator da CPMI do INSS aponta presidente da Conafer como articulador de esquema de fraudes milionárias

O relator da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do INSS), deputado Alfredo Gaspar (União-AL), afirmou nesta segunda-feira (29) que o presidente da Confederação Nacional de Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais (Conafer), Carlos Roberto Ferreira Lopes, estaria no centro de um dos maiores esquemas de fraudes contra aposentados e pensionistas já revelados no país.

Segundo Gaspar, mais de R$ 800 milhões passaram pelas mãos da entidade nos últimos anos, e pelo menos R$ 140 milhões teriam sido direcionados diretamente ao suposto operador do esquema, Cícero Marcelino, apontado como assessor e braço direito de Lopes.

“Hoje a gente descobriu outro Maurício Camisotti, se chama Carlos Roberto Ferreira Lopes. Pelas mãos da Conafer passaram mais de R$ 800 milhões, aqui nós descobrimos que R$ 140 milhões foram direcionados diretamente para o assessor dele, Cícero Marcelino”, declarou o relator.

O esquema revelado pela Polícia Federal

As suspeitas sobre a Conafer já vinham sendo investigadas desde abril, quando a Polícia Federal revelou um esquema de cadastros fraudulentos em benefícios do INSS. Segundo a apuração, aposentados e pensionistas eram incluídos em associações sem autorização, muitas vezes com assinaturas falsas, para permitir descontos automáticos de mensalidades em seus benefícios.

Esse tipo de prática gerava desvio de recursos de pessoas vulneráveis, que só percebiam a fraude ao notarem reduções em seus salários pagos pelo INSS.
Conexões empresariais e movimentações suspeitas

Durante depoimento à CPMI, Carlos Lopes negou que Cícero Marcelino fosse funcionário da Conafer. Segundo ele, Marcelino era apenas um fornecedor da entidade há mais de 15 anos.

“O Cícero nunca foi funcionário da Conafer. O Cícero sempre foi um fornecedor de bens e serviços da Conafer por mais de 15 anos. E pegou essa pecha de falar que era assessor – assessor são os egos da amizade, né? Como nós todos vimos aqui. É o querido, é o amigo”, disse Lopes.

Apesar disso, a comissão apresentou indícios de que Marcelino seria sócio de Lopes em empresas no Brasil e no exterior. Entre elas, uma offshore em Delaware, nos Estados Unidos, que teria como objetivo desenvolver uma fintech para cobrança de mensalidades da Conafer.

Além disso, documentos apontam que Marcelino também atuava como procurador de uma empresa ligada à esposa de Carlos Lopes. Há ainda registros de que as esposas de ambos participaram de licitações envolvendo emendas parlamentares, como uma de R$ 2 milhões destinada pelo deputado federal Euclydes Pettersen (Republicanos-MG).

O relator Alfredo Gaspar foi enfático:

“Se isso não for lavagem de dinheiro, enriquecimento ilícito e formação de organização criminosa, é melhor fechar a CPMI”.

R$ 100 milhões em contratos questionados

Segundo os dados levantados pela CPMI, a empresa Santos Agroindústria Atacadista e Varejista recebeu ao longo dos anos mais de R$ 100 milhões da Conafer. Para justificar as movimentações, Lopes afirmou que os recursos foram utilizados em serviços como locação de veículos, compra de insumos agrícolas, brinquedos para campanhas sociais e até sêmen para melhoramento genético de rebanhos.

No entanto, a Receita Federal aponta que a empresa tem conexões diretas com outras de propriedade de Marcelino, reforçando as suspeitas de triangulação financeira.

Crescimento anormal de cadastros na pandemia

Outro ponto levantado pela CPMI foi um relatório do INSS de outubro de 2020, que identificou um comportamento atípico da Conafer durante a pandemia de Covid-19.

Entre abril e agosto de 2020, período marcado por restrições sanitárias, a entidade registrou 95.818 novos associados, o que equivaleria a mais de 630 cadastros diários com autorizações individuais — algo considerado “impraticável” pelas autoridades.

O próprio INSS pediu a rescisão do Acordo de Cooperação Técnica (ACT) com a Conafer, justamente para impedir a continuidade dos descontos automáticos.

Na ocasião, a entidade alegou que não poderia fornecer documentos comprobatórios porque suas sedes estariam fechadas em função das medidas restritivas da pandemia.

Impacto e próximos passos

As revelações aumentam a pressão sobre a CPMI, que já havia identificado outros núcleos fraudulentos no esquema envolvendo associações de aposentados. O relator Alfredo Gaspar promete ampliar as investigações sobre a atuação da Conafer e encaminhar os indícios ao Ministério Público Federal e à Polícia Federal para responsabilização criminal.

O caso, que envolve cifras milionárias e acusações de lavagem de dinheiro, enriquecimento ilícito e formação de organização criminosa, expõe mais uma vez as vulnerabilidades do sistema de descontos em folha do INSS e abre debate sobre a necessidade de maior fiscalização nas parcerias entre entidades e órgãos previdenciários.