Inflação, juros e câmbio: projeções do mercado e desafios do Banco Central para 2025

Desde janeiro de 2025, o Brasil passou a adotar o sistema de meta contínua de inflação, uma mudança significativa na condução da política monetária. O objetivo central é manter a inflação em 3% ao ano, sendo considerado dentro da meta qualquer resultado que varie entre 1,5% e 4,5%.

Pelo modelo, o Banco Central (BC) é responsável por calibrar a taxa básica de juros, a Selic, para que os preços permaneçam dentro desse intervalo. A política monetária, entretanto, não tem efeito imediato: os impactos dos juros sobre a economia levam entre 6 e 18 meses para serem plenamente sentidos. Por isso, o BC trabalha sempre olhando para o futuro.

Atualmente, a instituição já considera as projeções de inflação acumulada em 12 meses até o primeiro trimestre de 2027, e não apenas os resultados mais imediatos.

Descumprimento da meta e carta pública

O novo regime prevê que, caso a inflação permaneça fora do intervalo de tolerância por seis meses consecutivos, a meta é considerada descumprida. Nessa situação, o presidente do BC é obrigado a enviar uma carta pública ao ministro da Fazenda explicando as razões do desvio.

Foi o que ocorreu em junho de 2025. Pela segunda vez no ano, o presidente do BC, Gabriel Galípolo, encaminhou o documento ao ministro Fernando Haddad.

Segundo Galípolo, a inflação brasileira ultrapassou o teto de 4,5% no acumulado de 12 meses até junho devido a uma combinação de fatores:

  • atividade econômica aquecida, que pressiona a demanda;
  • variação cambial, com o dólar mais caro encarecendo importados;
  • custo da energia elétrica, impactado por crises no setor;
  • anomalias climáticas, que prejudicaram safras agrícolas e elevaram o preço dos alimentos.

Por que isso importa? 

Quanto mais elevada a inflação, menor o poder de compra da população, especialmente entre os mais pobres. Isso acontece porque os salários não sobem na mesma proporção que os preços, comprimindo o orçamento familiar.

PIB: crescimento moderado

As expectativas do mercado financeiro para o Produto Interno Bruto (PIB) permanecem estáveis.

  • Para 2025, a projeção é de crescimento de 2,16%.
  • Para 2026, a expectativa é de 1,80%.

O PIB é a soma de todos os bens e serviços produzidos no país e representa o desempenho da economia.

Taxa de juros: patamar elevado

O mercado financeiro manteve as estimativas para a taxa Selic nos próximos anos:

  • 2025: 15% ao ano (nível atual, o mais alto em quase 20 anos).
  • 2026: 12,25% ao ano.
  • 2027: 10,50% ao ano.

A Selic elevada tem como objetivo controlar a inflação, mas também encarece o crédito e limita a expansão econômica.

Dólar, balança comercial e investimentos

  • Outros indicadores importantes também foram atualizados pelo mercado:
  • Dólar: caiu de R$ 5,50 para R$ 5,48 no fim de 2025; para 2026, a projeção recuou de R$ 5,60 para R$ 5,58.
  • Balança comercial: superávit projetado para 2025 caiu de US$ 64,8 bilhões para US$ 64,6 bilhões; para 2026, expectativa mantida em US$ 68,4 bilhões.
  • Investimento estrangeiro direto (IED): projeção de US$ 70 bilhões para 2025 e 2026, sem alterações.

Esses números refletem a percepção de estabilidade relativa, mas também sinalizam cautela diante das incertezas globais e domésticas.

Desafios à frente

O Brasil vive, portanto, um dilema clássico de política econômica:

  • Segurar a inflação com juros altos, mas arriscando desacelerar a economia;
  • Estimular o crescimento com juros menores, correndo o risco de nova disparada inflacionária.

Com a inflação acima do teto da meta e o PIB crescendo de forma moderada, o desafio do Banco Central e do Ministério da Fazenda será equilibrar controle de preços, estímulo ao investimento e proteção do poder de compra da população nos próximos anos.

Evolução do regime de metas de inflação no Brasil

Anos 1990: o início da estabilização

  • 1994: o Plano Real trouxe a estabilização da moeda, mas o país ainda convivia com pressões inflacionárias.
  • 1999: após a crise cambial, o Brasil adotou oficialmente o regime de metas de inflação, inspirado em modelos já usados em países desenvolvidos. A decisão foi formalizada pelo Decreto 3.088/1999.

Objetivo: dar previsibilidade à economia e ancorar expectativas, oferecendo ao Banco Central um parâmetro claro para definir a política monetária.

2000 a 2010: consolidação do sistema

  • Durante os governos Fernando Henrique Cardoso, Lula e início de Dilma Rousseff, o regime se consolidou como principal ferramenta de combate à inflação.
  • As metas eram definidas anualmente pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), com intervalos de tolerância que variavam de 2 a 2,5 pontos percentuais para cima ou para baixo.
  • O BC elevava ou reduzia a taxa Selic para alinhar os preços à meta estabelecida.

 Exemplos:

  • 2003: inflação chegou a 9,3% (acima da meta), levando o BC a enviar carta explicativa ao ministro da Fazenda.
  • 2006-2007: inflação dentro da meta, reforçando a credibilidade do sistema.

2011 a 2016: pressões e críticas

  • Durante o governo Dilma Rousseff, surgiram críticas de que o regime de metas teria sido “flexibilizado” na prática, com maior tolerância à inflação elevada.
  • O período foi marcado por forte aumento de gastos públicos, tarifas represadas (energia, combustíveis) e, posteriormente, recessão econômica.
  • Em 2015, a inflação atingiu 10,67%, muito acima do teto da meta, exigindo forte elevação dos juros

2017 a 2024: ajustes e debates sobre o modelo

  • O governo Michel Temer retomou a disciplina fiscal, e o BC conseguiu trazer a inflação de volta ao centro da meta.
  • Durante a gestão Jair Bolsonaro, sob o presidente do BC Roberto Campos Neto, a inflação disparou com a pandemia de Covid-19 (2020-2021) e a crise energética global (2022).
  • A meta continuou sendo definida ano a ano, mas o debate sobre adotar metas contínuas (sem referência a um ano-calendário específico) ganhou força entre economistas e autoridades.

2025: adoção da meta contínua

  • No governo Lula (3º mandato), o Conselho Monetário Nacional aprovou a adoção do sistema de meta contínua de inflação, alinhado a práticas de países como o Canadá e a Nova Zelândia.
  • A meta foi fixada em 3% ao ano, com intervalo de tolerância de 1,5% a 4,5%.

Diferença principal:

  • Antes: a inflação era comparada com a meta definida para cada ano fechado.
  • Agora: a avaliação é contínua, considerando sempre a inflação acumulada em 12 meses.
  • Caso a inflação ultrapasse o intervalo de tolerância por seis meses consecutivos, o presidente do BC deve enviar carta pública ao ministro da Fazenda.

Em junho de 2025, o presidente do BC, Gabriel Galípolo, precisou acionar o mecanismo após a inflação ficar acima do teto (4,5%) por seis meses seguidos.

Impacto do novo modelo

  • O sistema contínuo aumenta a transparência e a responsabilidade do Banco Central.
  • A meta de 3% busca alinhar o Brasil a padrões internacionais de inflação baixa e estável.
  • O desafio é equilibrar a política monetária em um país com histórico de choques externos, volatilidade cambial e vulnerabilidade fiscal.