Especialistas dizem que PL da Dosimetria afrouxa progressão de pena e pode beneficiar criminosos comuns
Especialistas em direito penal afirmam que o Projeto de Lei da Dosimetria, aprovado na Câmara dos Deputados, reduz o tempo de progressão de pena e pode beneficiar criminosos comuns, apesar de ter sido apresentado como medida voltada aos condenados pelos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023, incluindo o ex-presidente Jair Bolsonaro.
Segundo o professor de direito da PUC do Rio Grande do Sul, Rodrigo Azevedo, o texto aprovado reduz de forma significativa os percentuais mínimos para progressão, especialmente nos crimes não violentos.
“Na prática, ela beneficia sim criminosos comuns, pois padroniza o marco básico de progressão em um sexto da pena, reservando percentuais mais altos apenas para crimes violentos e hediondos. Isso representa um afrouxamento relevante em relação ao sistema atual”, afirmou.
Para o professor de direito da PUC do Rio, João Vicente Tinoco, a proposta reverte parte do endurecimento trazido pelo pacote anticrime de 2019. “O que o PL da Dosimetria faz agora é dar um passo atrás. Ele não volta totalmente ao texto anterior, mas flexibiliza algumas hipóteses.”
O relator da proposta, deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP), nega que o texto produza efeitos além dos casos do 8 de janeiro. “Não há nenhuma possibilidade de este texto beneficiar crime comum”, disse na votação. Mas especialistas rejeitam essa interpretação.
Azevedo explica que a Lei de Execução Penal é geral e vale para todos os condenados, o que impossibilita restringir sua aplicação a um grupo específico. Ele cita como exemplo que um condenado por roubo hoje só progride após cumprir 40% da pena. Com o PL, um réu primário poderia progredir com 25%.
O que muda
O PL 2.162/2023 estabelece progressão de regime com um sexto da pena cumprida, ou seja, 16% — patamar atualmente aplicado apenas a réus primários em crimes não violentos. O texto também passa a permitir a progressão reduzida para condenados por crimes cometidos com violência ou grave ameaça.
Ao mesmo tempo, o projeto cria exceções: crimes contra a pessoa e contra o patrimônio exigirão pelo menos 25% da pena. Porém, juristas alertam que há vários crimes violentos fora desses títulos que acabarão contemplados pelo percentual menor.
Foram citados ainda riscos de distorções ao se alterar a lei com foco em beneficiar casos específicos. “Quando o legislador mexe na regra geral pensando em uma pessoa ou um grupo, cria distorções difíceis de prever”, afirmou Tinoco.
Azevedo destaca ainda a contradição entre o PL da Dosimetria e o PL Antifacção, aprovado recentemente e que endurece a progressão de integrantes de facções criminosas. “Projetos contraditórios fragilizam o Sistema Único de Segurança Pública e geram insegurança jurídica.”
O texto agora segue para análise na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, sob relatoria do senador Esperidião Amim (PP-SC), aliado do ex-presidente Jair Bolsonaro e defensor de anistia total aos condenados pelo 8 de janeiro.
