Hamas responde a plano de paz de Trump e aceita libertar reféns sob condições

O Hamas anunciou, nesta sexta-feira (3/10), que respondeu ao plano de paz na Faixa de Gaza proposto pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. O grupo palestino afirmou estar disposto a libertar todos os reféns israelenses e a abrir mão do governo no enclave, desde que alguns pontos da proposta sejam discutidos.

Em comunicado, a organização declarou:

“Para alcançar o fim da guerra e a retirada completa das forças de Israel da Faixa de Gaza, o movimento anuncia sua concordância em libertar todos os prisioneiros da ocupação, vivos e cadáveres, conforme a fórmula de troca contida na proposta do presidente Trump, e providenciar as condições de campo para o processo de troca. Nesse sentido, o movimento confirma sua prontidão para entrar imediatamente, por meio dos mediadores, em negociações para discutir os detalhes disso.”

O Hamas também sinalizou que aceita transferir a administração de Gaza para um comitê palestino independente, como previsto na proposta norte-americana.

Apesar da sinalização positiva, o grupo não comentou outros 18 pontos do acordo, que incluem a deposição das armas e a reconstrução do território. Segundo o comunicado, temas relacionados ao futuro da Faixa de Gaza e aos direitos do povo palestino precisam ser debatidos em um “quadro nacional unificado”.

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A manifestação ocorreu poucas horas após o ultimato de Trump, que estabeleceu prazo até este domingo (5/10) para que o Hamas se posicionasse.

Israel, por sua vez, já havia aceitado a proposta durante visita do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu aos EUA nesta semana, mas sinalizou que pode não cumprir um dos pontos centrais do plano: a retirada total de suas tropas do enclave palestino.

Análise: possível vitória política de Trump

Caso o acordo seja confirmado, o presidente Donald Trump poderá se apresentar como o grande articulador da paz no Oriente Médio. Isso reforça sua narrativa política de que é capaz de “encerrar guerras” e obter resultados práticos onde seus antecessores falharam.

Trump já havia utilizado esse discurso em sua propaganda eleitoral, ao afirmar que sob sua liderança os Estados Unidos não iniciaram novos grandes conflitos e buscaram reduzir a presença militar em áreas de tensão. Se o Hamas realmente cumprir a promessa de libertar reféns e abrir mão do controle de Gaza, o presidente norte-americano terá uma conquista concreta para apresentar como símbolo de sua habilidade diplomática e de sua postura firme nas negociações.

Além disso, a aceitação parcial do Hamas e a anuência de Israel colocam Trump no centro das atenções globais, reposicionando os EUA como atores diretos na mediação de conflitos no Oriente Médio, mesmo em um cenário no qual outras potências — como Rússia e Irã — também têm atuado na região.

A imagem de “pacificador pragmático” pode fortalecer sua base de apoio interna e projetar influência externa, ampliando sua capacidade de usar o acordo como trunfo político em um momento de disputas intensas dentro e fora dos EUA.

O conflito Hamas x Israel

O conflito entre Hamas e Israel é um dos mais complexos e duradouros do Oriente Médio. Ele tem raízes históricas na disputa pelo território palestino e na criação do Estado de Israel, em 1948, mas se intensificou com a ascensão do Hamas nos anos 2000.

O Hamas, considerado um grupo islamista radical, assumiu o controle da Faixa de Gaza em 2007, após confrontos com a Autoridade Palestina. Desde então, o enclave vive sob bloqueio militar israelense, que restringe circulação de pessoas, mercadorias e recursos básicos.

A relação entre os dois lados tem sido marcada por ciclos de violência, com lançamentos de foguetes por parte do Hamas e bombardeios israelenses em resposta. Milhares de civis já morreram ao longo das décadas, e a região permanece em constante instabilidade.

Nos últimos anos, a guerra em Gaza se tornou ainda mais dramática, com destruição de infraestrutura, crises humanitárias, deslocamentos forçados e ausência de perspectivas de um acordo duradouro.

O plano de paz proposto por Trump surge nesse contexto como uma tentativa de romper esse ciclo. Se implementado, pode representar um passo histórico — mas o ceticismo permanece, já que os entraves vão desde o não cumprimento de condições por Israel até a resistência de alas mais radicais do Hamas, que não aceitam abrir mão da luta armada.

Por que a ONU não considera o Hamas como grupo terrorista

1. Ausência de consenso internacional sobre o termo "terrorismo"

Um dos principais motivos é que a ONU não possui uma definição universal de terrorismo aceita por todos os seus Estados-membros.

Desde os anos 1970, diversas tentativas foram feitas para chegar a um conceito jurídico internacional que enquadrasse grupos e ações como terroristas, mas sempre esbarraram em impasses políticos.

Países ocidentais (como EUA, Reino Unido, Canadá e União Europeia) pressionam por uma definição que inclua grupos armados que atacam civis.

Países árabes e muçulmanos, em especial membros da Liga Árabe e da Organização da Cooperação Islâmica, argumentam que há diferença entre terrorismo e “luta legítima pela autodeterminação” contra ocupação estrangeira.

Esse impasse fez com que a ONU preferisse tratar caso a caso, sem criar uma “lista negra” oficial de organizações terroristas.

2. A influência do contexto palestino

O Hamas se apresenta como um movimento de resistência palestino contra a ocupação israelense, e isso divide as opiniões dentro da ONU.

Para EUA, Israel, União Europeia, Japão e Canadá, o Hamas é um grupo terrorista por utilizar atentados suicidas, foguetes contra civis e ações militares contra Israel.

Para países árabes, Irã, Rússia, China e boa parte do chamado Sul Global, o Hamas é uma força política e militar legítima, vinculada à luta pela libertação da Palestina.

Essa divisão política reflete diretamente nas votações dentro da ONU, impedindo que se alcance a maioria necessária para enquadrá-lo como “terrorista”.

3. O papel do Hamas como força política em Gaza

O Hamas não é apenas um grupo armado — ele também exerce papel de governo.

Desde 2007, após vencer eleições legislativas palestinas e assumir o controle da Faixa de Gaza, o movimento administra o território, controla fronteiras, fornece serviços básicos e mantém instituições de Estado.

Declarar o Hamas como terrorista de forma oficial pela ONU significaria, na prática, rotular toda a administração de Gaza como terrorista. Isso complicaria qualquer tentativa de negociações de paz e inviabilizaria a própria ajuda humanitária internacional, que precisa dialogar com o grupo para chegar até a população local.

4. A diplomacia da ONU e a mediação de conflitos

A ONU, através de suas agências e do Conselho de Segurança, muitas vezes atua como mediadora entre Israel e o Hamas em momentos de conflito.

Para conseguir negociar cessar-fogos, trocas de prisioneiros e entrada de ajuda humanitária, a ONU precisa manter alguma neutralidade formal.

Se a organização declarasse o Hamas como terrorista, perderia sua capacidade de diálogo com um dos lados do conflito, o que na prática poderia agravar a situação em Gaza e reduzir as chances de mediação.

5. O impasse no Conselho de Segurança

Outro fator é a estrutura política da ONU.

No Conselho de Segurança, que tem poder para aprovar resoluções vinculantes, EUA e aliados geralmente votam a favor de condenar o Hamas. Já Rússia e China se opõem a classificá-lo como terrorista, argumentando que isso fortaleceria Israel e enfraqueceria qualquer possibilidade de negociação de paz justa.

Ou seja, o veto cruzado das potências impede que haja uma resolução oficial nesse sentido.

Fechando questão

A ONU não considera o Hamas um grupo terrorista porque:

  • Não existe consenso internacional sobre o conceito de terrorismo.
  • O movimento é visto por parte da comunidade internacional como resistência à ocupação.
  • O Hamas exerce papel de governo em Gaza, o que complica classificações absolutas.
  • A ONU busca manter espaço de diálogo para mediar conflitos.
  • Os vetos no Conselho de Segurança impedem decisões unificadas.

Assim, enquanto países e blocos adotam suas próprias listas de organizações terroristas, a ONU mantém uma posição de neutralidade institucional, tratando o Hamas como um ator político e militar envolvido em um conflito regional — o que é essencial para sua diplomacia, mas também alvo de críticas de Israel e de governos ocidentais.