O “ECA Digital” e o desafio de proteger crianças e adolescentes no ambiente virtual
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Projeto visa atenuar riscos a segurança de crianças |
A aprovação do requerimento de urgência para o Projeto de Lei 2628/22 pela Câmara dos Deputados marca um momento decisivo no debate sobre a proteção de crianças e adolescentes no ambiente digital. Conhecido como “ECA Digital”, em alusão ao Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), o texto busca estabelecer regras mais claras para plataformas digitais, aplicativos, jogos e redes sociais quanto à responsabilidade de prevenir riscos e garantir segurança no acesso por parte dos mais jovens.
A urgência e sua simbologia
Ao aprovar a urgência, os deputados abriram caminho para que o projeto seja votado diretamente em Plenário, sem passar pelo trâmite habitual nas comissões. Esse gesto político revela a sensibilidade do Congresso diante da pressão da opinião pública, especialmente após a repercussão do vídeo do influenciador Felca Bressanim Pereira, que expôs situações de exploração de perfis infantis em redes sociais para fins de engajamento e monetização.
O episódio mostra como a pauta da proteção digital das crianças deixou de ser apenas uma preocupação de especialistas e ganhou destaque na sociedade civil, exigindo respostas rápidas do Legislativo.
O que propõe o projeto
De autoria do senador Alessandro Vieira (MDB-SE) e relatado na Câmara pelo deputado Jadyel Alencar (Republicanos-PI), o PL 2628/22 impõe obrigações às plataformas digitais, entre elas:
- Implementar medidas “razoáveis” para restringir o acesso de crianças e adolescentes a conteúdos ilegais ou inadequados;
- Oferecer ferramentas que permitam aos pais e responsáveis exercer controle sobre o uso das plataformas;
- Reforçar mecanismos de identificação e denúncia de situações que possam expor menores a riscos.
Embora o texto ainda dependa de votação final, já conta com apoio de centenas de organizações ligadas à proteção da infância, o que amplia seu peso político e social.
A importância e os desafios
O debate sobre o “ECA Digital” é central em um momento em que o ambiente virtual se tornou extensão da vida social, escolar e até afetiva das crianças. Por outro lado, a internet ainda é terreno fértil para práticas nocivas, desde a exposição precoce a conteúdos adultos até formas de exploração e aliciamento.
A iniciativa legislativa, portanto, representa um esforço de atualização das normas brasileiras frente à realidade tecnológica. O Estatuto da Criança e do Adolescente, criado em 1990, não contemplava a internet como conhecemos hoje — era necessário um novo marco regulatório para lidar com os desafios do século XXI.
Contudo, o projeto também levanta questões práticas: até onde vai a responsabilidade das plataformas? Como evitar que a regulamentação limite a liberdade de expressão ou inviabilize o funcionamento de pequenos produtores digitais? A noção de medidas “razoáveis” precisa ser bem definida para que não se torne vaga ou ineficaz.
O impacto político e social
O fato de a proposta ser analisada em regime de urgência sinaliza que a Câmara reconhece o caráter emergencial da proteção digital da infância. Mais do que isso, o projeto reflete uma pressão crescente sobre o Estado brasileiro para assumir protagonismo frente a gigantes da tecnologia que, muitas vezes, resistem a assumir responsabilidades no país.
Caso aprovado, o “ECA Digital” poderá consolidar um novo padrão de relação entre plataformas e sociedade, estabelecendo um equilíbrio entre inovação, liberdade de uso e, principalmente, a preservação da integridade de crianças e adolescentes.
Um divisor de águas
A votação do “ECA Digital” será um divisor de águas na legislação brasileira sobre internet e infância. Mais do que um ajuste jurídico, trata-se de um marco simbólico que reforça a prioridade absoluta dos direitos da criança e do adolescente, princípio já consagrado no ECA original.

MAURÍCIO JÚNIOR
Colunista desde 2012 quando iniciou suas análises sobre a política e como esta molda o mundo.
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